quarta-feira, 27 de junho de 2012

MIRANDA


   Eu gostaria de ter sido musicista.  Eu não deveria ter sido escrituária. Eu escrevo o que me ditam. Eu não sigo os meus passos. Estou de frente à uma folha de papel em branco reproduzindo palavras que não são minhas. Estou sozinha. Já tinham me avisado que o ser humano é só. Eu não acreditei, eu ri, eu já tive sonhos. Hoje eu não ouso.
   Eu me mato aos poucos. Corto em camadas os meus pulsos em baforadas nojentas de cigarro. Joguei tudo fora. Desisti. Acreditei em um caminho de pedras amarelas que me levaria de volta para casa, um lugar que acreditei que fosse meu. Me iludi. Não tenho lugar. Volto pra cama todos os dias sem voltar.
   Meu poucos amigos são os que fiz na infância. Ficaram armazenados em um antigo album de retratos guardado no fundo do armário, junto a minha vela de primeira comunhão e aos velhos óculos de meu pai. Fui juntando as lembranças. Fui juntando pó. E só com elas ainda sinto. Por isso vivo.  
   É estranho não sonhar. Olho para frente e vejo apenas essa folha em branco, essa velha máquina de datilografar aguardando as frases a serem ditadas. Nem as palavras são minhas.
   Eu tenho vergonha da coragem que eu não tive. De ter traído os meus princípios. De não ter agido. De não ter dito não. De não ter me vingado com facas de todos os que me iludiram. De não ter revidado tapas (bateu levou). De ter aceitado mentiras, de não ter sido feminista, de não erguer bandeiras em frente à casa como um Americano patriota. Eu tenho vergonha das minhas unhas roídas, da minha velhice precoce, do meu fracasso. Eu tenho vergonha do meu salário, e de pagar imposto no Brasil. E eu tenho, acima de tudo, medo. Medo de ter desistido, de chegar aos 50 pensando no que eu poderia ter sido de bom ao mundo antes que ele se tornasse essa carcaça de mentiras, onde sonhos se transformam em comerciais de banco e vídeos virais.  Medo.
   Eu deveria ter sido musicista. Ter tocado piano, ter cantado, ter arriscado notas vulgares em qualquer violão. Eu deveria ter acreditado , ter investido, mas eu achei um outro caminho e dei valor às coisas erradas. E isso se aprende tarde. A vida deveria vir com amostra grátis de cada escolha, pelo menos uma, aquela, a derradeira, para ao menos uma vez poder voltar atrás.
   Mas olha, daqui pra frente…
-         - Miranda - escuto meu nome.  - Vamos começar?
-         - Sim senhor – é o que digo.

"Quando o lobo estende a mão à Chapeuzinho ela confia, ele sorri. Mas quais são suas intenções? Por que lhe cheira? Por que lhe sorri? Por que lhe olha? Chapeuzinho estava morta na sua própria ingenuidade. Não foi ele quem a devorou foi a realidade. Ele sorria para lhe comer. Ele a recebia com doces para lhe comer. No fundo tudo o que fazia ou falava era para lhe comer. Chapeuzinho está velha, não é mais menina. Fuma cigarros e coleciona cartas antigas. Vive do passado. Do que pensou que encontraria na estrada de pedras que lhe sorria. Ela achou que voltaria para casa em um belo caminho com borboletas azuis. Está morta. Sem casa, sem príncipe, sem passado, sem Salvador."
-       
          - Obrigada Miranda, até amanhã. E vê se ajeita esse cabelo, você está parecendo uma tia velha com preguiça de tomar banho. – ele disse. Eu ignorei.
   Era tarde, dezenove horas de um dia longo. Fecho a máquina. bato o ponto. Assino. Sorrio amarelo para todos os lobos. Volto, ligo a Tv, choro com a propaganda e como um biscoito. 

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Mudança.



A Menina que ri cresceu. Não é mais menina. Virou borboleta. Ela se foi e eu fiquei. E pra começar bem, nada melhor do que uma das cenas que mais amo rever. Do filme "A Primeira Noite de um Homem" (The Graduate), Dustin Hoffman e Katharine Ross (linda) imortalizando no cinema a coragem de mudar. Porque em certos momentos decisões devem ser tomadas. A vida não vem com amostra grátis. Ou é ou foi. Bem vindos.